"Muito se sabe de uma história sabendo-se sobre quem a conta. E muito de uma história dependerá de quem a escutar."

"Muito se sabe de uma história sabendo-se sobre quem a conta. E muito de uma história dependerá de quem a escutar."

O Pacto: Arte & autor

    Do autor sobre a obra:

      Quem já escreveu sabe: não temos domínio sobre nada. Pois quando construímos um enredo, os processos que criam os personagens e eventos facilmente nos escapam. E quando tentamos retornar ao controle, aí mesmo que nos fogem de vez. E se forçamos o processo, ele se torna qualquer outra coisa, mas nunca uma boa história. 

    Pois se na criação de um texto descritivo o desejo do autor emerge de alguma forma, em um texto artístico ele simplesmente tem o controle. A criação de uma história é mobilizada por uma vontade que se expressa de forma tão rápida e em uma dinâmica que torna a sua real motivação praticamente inconsciente, ou de fato inacessível. O impulso, inspiração, ou o pontapé inicial de uma história geralmente surge assim, emergindo abruptamente do que chamamos “do nada”, ao ser estimulado na superfície por aquilo que o invoca.

     E o meu “do nada,” ao pensar neste livro, ocorreu enquanto observava um velho solitário em uma estação rodoviária. E talvez porque não exista nada mais afastado e semelhante a uma criança do que um idoso abandonado, isso me tenha feito pensar na única fase comum a todo o ser humano. Podemos escapar da velhice, ou da maturidade, morrendo jovens ou lançando mão de algum artificio que funcione por algum tempo. Mas quem já viveu por qualquer tempo que seja, não escapou da infância. A fase que por mais que tenha sido repensada ao longo do tempo, nunca foi definitivamente conceituada, nem será. Só podemos dizer com certeza que ela existe,  que é algo diferente da fase jovem, ou adulta. O que pode ser observado tanto com crianças, quanto com filhotes de gato.

      Nossa maturidade pode ser considerada como um invólucro dessa dimensão mais antiga e profunda. Onde o tempo é de fato percebido de outra forma e os afetos estão recebendo seus primeiros nomes. Então, Um conto das maldições do Cervo Invernal, que antes chamava-se apenas “Josh”, o nome do personagem principal, foi  minha tentativa de falar sobre a incurável infância, mas que me escapou totalmente do controle, para o bem do próprio enredo.

      Um dos pontos que considerei ao escrever o livro, foi o de não adotar uma estilização sombria ao retratar o universo infantil, algo bem comum de acontecer. Como quando transportam o universo da criança para uma estética quase de terror, com os personagens estilizados  de forma sinistra. Então ao retratar as passagens mais lúdicas elas são assim de fato, como quando Josh corre atrás de uma família de ratos, ou quando as crianças invadem Jungenreich, a fabulosa loja de brinquedos. Porém, quando a narrativa oscila para aspectos mais duros e realistas, ela faz num movimento de continuidade, mas sem avisar da explosão de uma bomba e suas consequências. A intenção, apesar de confrontar o universo infantil com reflexões mais duras, é a de não o corromper transformando fábula em conto de terror. Por isso, as transições do lúdico ao trágico podem ser bruscas, mas não contaminadas entre si.

O Pacto: Arte & autor

    Do autor sobre a obra:

      Quem já escreveu sabe: não temos domínio sobre nada. Pois quando construímos um enredo, os processos que criam os personagens e eventos facilmente nos escapam. E quando tentamos retornar ao controle, aí mesmo que nos fogem de vez. E se forçamos o processo, ele se torna qualquer outra coisa, mas nunca uma boa história. 

    Pois se na criação de um texto descritivo o desejo do autor emerge de alguma forma, em um texto artístico ele simplesmente tem o controle. A criação de uma história é mobilizada por uma vontade que se expressa de forma tão rápida e em uma dinâmica que torna a sua real motivação praticamente inconsciente, ou de fato inacessível. O impulso, inspiração, ou o pontapé inicial de uma história geralmente surge assim, emergindo abruptamente do que chamamos “do nada”, ao ser estimulado na superfície por aquilo que o invoca.

     E o meu “do nada,” ao pensar neste livro, ocorreu enquanto observava um velho solitário em uma estação rodoviária. E talvez porque não exista nada mais afastado e semelhante a uma criança do que um idoso abandonado, isso me tenha feito pensar na única fase comum a todo o ser humano. Podemos escapar da velhice, ou da maturidade, morrendo jovens ou lançando mão de algum artificio que funcione por algum tempo. Mas quem já viveu por qualquer tempo que seja, não escapou da infância. A fase que por mais que tenha sido repensada ao longo do tempo, nunca foi definitivamente conceituada, nem será. Só podemos dizer com certeza que ela existe,  que é algo diferente da fase jovem, ou adulta. O que pode ser observado tanto com crianças, quanto com filhotes de gato.

      Nossa maturidade pode ser considerada como um invólucro dessa dimensão mais antiga e profunda. Onde o tempo é de fato percebido de outra forma e os afetos estão recebendo seus primeiros nomes. Então, Um conto das maldições do Cervo Invernal, que antes chamava-se apenas “Josh”, o nome do personagem principal, foi  minha tentativa de falar sobre a incurável infância, mas que me escapou totalmente do controle, para o bem do próprio enredo.

      Um dos pontos que considerei ao escrever o livro, foi o de não adotar uma estilização sombria ao retratar o universo infantil, algo bem comum de acontecer. Como quando transportam o universo da criança para uma estética quase de terror, com os personagens estilizados  de forma sinistra. Então ao retratar as passagens mais lúdicas elas são assim de fato, como quando Josh corre atrás de uma família de ratos, ou quando as crianças invadem Jungenreich, a fabulosa loja de brinquedos. Porém, quando a narrativa oscila para aspectos mais duros e realistas, ela faz num movimento de continuidade, mas sem avisar da explosão de uma bomba e suas consequências. A intenção, apesar de confrontar o universo infantil com reflexões mais duras, é a de não o corromper transformando fábula em conto de terror. Por isso, as transições do lúdico ao trágico podem ser bruscas, mas não contaminadas entre si.

Sobre as ilustrações:

Sobre as ilustrações:

      Sempre gostei de abrir um livro e ver gravuras que não estavam exatamente relacionadas com os eventos do trecho em questão, e que muitas vezes eram diferentes daquilo que imaginava para os personagens. Elas eram como spoilers que antes de frustrar,  instigavam a leitura. E apesar deste não ser um livro ilustrado, e nunca foi essa intenção, não me foi possível como desenhista compulsivo não fazer algumas interpretações visuais do que eu próprio escrevi.

L.C.Roman - 2021 ©

      Sempre gostei de abrir um livro e ver gravuras que não estavam exatamente relacionadas com os eventos do trecho em questão, e que muitas vezes eram diferentes daquilo que imaginava para os personagens. Elas eram como spoilers que antes de frustrar,  instigavam a leitura. E apesar deste não ser um livro ilustrado, e nunca foi essa intenção, não me foi possível como desenhista compulsivo não fazer algumas interpretações visuais do que eu próprio escrevi.

L.C.Roman - 2021 ©
L.C.Roman - 2021 ©

      Porém, não as considero como parte do texto, nem de forma alguma uma versão visual definitiva sobre ele. Afinal, este não é de fato um livro infantil. E a forma como represento alguns trechos nas ilustrações salientam apenas o lado lúdico da história. E talvez pelo enredo tratar de temas às vezes tão ásperos e doloridos,  eu tenha preferido interpretar algumas passagens dessa forma: coloridas como embalagens para doces.

        E após as tê-las concluído,  percebo um paralelo entre a forma com que escrevi essa história e as ilustrações, com suas perspectivas bruscamente quebradas e escolha quase primárias  cores.

L.C.Roman - 2021 ©

      Porém, não as considero como parte do texto, nem de forma alguma uma versão visual definitiva sobre ele. Afinal, este não é de fato um livro infantil. E a forma como represento alguns trechos nas ilustrações salientam apenas o lado lúdico da história. E talvez pelo enredo tratar de temas às vezes tão ásperos e doloridos,  eu tenha preferido interpretar algumas passagens dessa forma: coloridas como embalagens para doces.

        E após as tê-las concluído,  percebo um paralelo entre a forma com que escrevi essa história e as ilustrações, com suas perspectivas bruscamente quebradas e escolha quase primárias  cores.

     Do Autor sobre o autor:

     Do Autor sobre o autor:

    Sou psicólogo, tenho 49 anos ao escrever este post, e escrevo sobre temas que me fascinam como a loucura, a memória e o tempo. Não classifico minhas histórias em um gênero definitivo, nem as dividido em nesta, ou naquela linha. Porque acredito que todas as histórias, ao final das contas, são sobre a perplexidade de estarmos aqui. E quando nos concentramos em um único assunto, é somente uma tentativa fracionada de nos entendermos dentro de um movimento contínuo de mudança. Basicamente, minhas histórias são sobre isso. Mas o que procuro mesmo é oferecer entretenimento, enquanto tudo segue passando rápido pela janela.

    Agora, antes de me considerar escritor, psicólogo, ou qualquer outra classificação que construímos para as coisas, posso dizer que sob tudo isso sou um leitor. Do tipo que queria ter acesso a uma biblioteca infinita em uma dimensão afastada do tempo.  Sou feliz  por ter nascido após tanta coisa boa ser escrita e infeliz por não ter acesso a Biblioteca de Babel de Borges, onde há tudo o que já foi e será escrito, onde  “não há na vasta biblioteca dois livros idênticos” ou decifráveis, assim como os homens. Ou seja,  sou outro observador perplexo com a eterna mudança de tudo,  que por ser uma constante,  sempre se repete.

                                                          L.C.Roman, maio 2021

    Sou psicólogo, tenho 49 anos ao escrever este post, e escrevo sobre temas que me fascinam como a loucura, a memória e o tempo. Não classifico minhas histórias em um gênero definitivo, nem as dividido em nesta, ou naquela linha. Porque acredito que todas as histórias, ao final das contas, são sobre a perplexidade de estarmos aqui. E quando nos concentramos em um único assunto, é somente uma tentativa fracionada de nos entendermos dentro de um movimento contínuo de mudança. Basicamente, minhas histórias são sobre isso. Mas o que procuro mesmo é oferecer entretenimento, enquanto tudo segue passando rápido pela janela.

    Agora, antes de me considerar escritor, psicólogo, ou qualquer outra classificação que construímos para as coisas, posso dizer que sob tudo isso sou um leitor. Do tipo que queria ter acesso a uma biblioteca infinita em uma dimensão afastada do tempo.  Sou feliz  por ter nascido após tanta coisa boa ser escrita e infeliz por não ter acesso a Biblioteca de Babel de Borges, onde há tudo o que já foi e será escrito, onde  “não há na vasta biblioteca dois livros idênticos” ou decifráveis, assim como os homens. Ou seja,  sou outro observador perplexo com a eterna mudança de tudo,  que por ser uma constante,  sempre se repete.

                                                          L.C.Roman, maio 2021

Pactos & Contos

         Um pouco sobre histórias mal contadas:

      Não tem nada mais instigante do que ouvir uma história mal contada, cheia de lacunas onde dentro daqueles espaços conseguimos perceber que há algo que nos sonda e se esconde. Quando nos contam um relato preciso, com todos os espaços preenchidos e organizados no tempo, sem nenhuma falha, nós ficamos conformados e logo o esquecemos, mas nunca ficamos satisfeitos. Porém, com uma história mal contada é diferente. E isso serve para as desculpas de um amante, ou casos arquivados sem solução. Nunca teremos sossego por aquilo que não foi dito. Deitaremos nossa cabeça no travesseiro à noite e bateremos palmas durante um aniversário, mas o que nunca foi contado continuará presente, ressoando. Talvez até não queiramos verdadeiramente saber o real desfecho das coisas. Porque afinal, as histórias mal contadas tem um enredo eterno. E não há nada que invejamos mais do que aquilo que perdura. Quando nos dizem que o universo vai expandir e desaparecer, isso é factível demais pra ser interessante, uma história mal explicada sobre castigos que recebermos pela eternidade é bem mais interessante.

     Então, o pacto é este: contar histórias mal contadas, que instiguem, deixem lacunas e que também falem sobre o que não foi escrito nelas.

Pactos & Contos

         Um pouco sobre histórias mal contadas:

      Não tem nada mais instigante do que ouvir uma história mal contada, cheia de lacunas onde dentro daqueles espaços conseguimos perceber que há algo que nos sonda e se esconde. Quando nos contam um relato preciso, com todos os espaços preenchidos e organizados no tempo, sem nenhuma falha, nós ficamos conformados e logo o esquecemos, mas nunca ficamos satisfeitos. Porém, com uma história mal contada é diferente. E isso serve para as desculpas de um amante, ou casos arquivados sem solução. Nunca teremos sossego por aquilo que não foi dito. Deitaremos nossa cabeça no travesseiro à noite e bateremos palmas durante um aniversário, mas o que nunca foi contado continuará presente, ressoando. Talvez até não queiramos verdadeiramente saber o real desfecho das coisas. Porque afinal, as histórias mal contadas tem um enredo eterno. E não há nada que invejamos mais do que aquilo que perdura. Quando nos dizem que o universo vai expandir e desaparecer, isso é factível demais pra ser interessante, uma história mal explicada sobre castigos que recebermos pela eternidade é bem mais interessante.

     Então, o pacto é este: contar histórias mal contadas, que instiguem, deixem lacunas e que também falem sobre o que não foi escrito nelas.

Em breve, outra história mal contada:

O Dramático Relato da Primeira Noite

      Nesta outra história mal contada, temos um dramático relato de seiscentas páginas, escrito em uma única noite, por um paciente recém-chegado a um hospital psiquiátrico nos arredores de Buenos Aires, durante um surto psicótico.

      Nele, o desesperado relator, narra uma farsesca aventura ocorrida numa ilha no extremo sul do continente, às vésperas da invasão das Malvinas. Para onde ele teria ido, auxiliando um holístico professor que fora convidado, junto com dois outros pesquisadores e um texano da indústria farmacêutica, para presenciar o êxito de uma pesquisa conduzida por um ex-médico nazista. Que de acordo com ele, teria sido descoberta a cura para a loucura.

      Nessa ilha, no tenebroso sul do Atlântico, entre pesquisadores inescrupulosos, pacientes maquiavélicos, macacos astutos e o mais perigoso alucinógeno de todos os tempos (falluspsilocybe), ele, o professor e mais os quatro desventurados companheiros, têm a cada 48 horas a chance de saírem do ciclo horrendo de alucinações a que foram submetidos, para encontrarem um meio de estabilizar a fórmula. E darem um fim à pesquisa da qual eles próprios viraram cobaias.

      Nesta outra história mal contada, temos um dramático relato de seiscentas páginas, escrito em uma única noite, por um paciente recém-chegado a um hospital psiquiátrico nos arredores de Buenos Aires, durante um surto psicótico.

      Nele, o desesperado relator, narra uma farsesca aventura ocorrida numa ilha no extremo sul do continente, às vésperas da invasão das Malvinas. Para onde ele teria ido, auxiliando um holístico professor que fora convidado, junto com dois outros pesquisadores e um texano da indústria farmacêutica, para presenciar o êxito de uma pesquisa conduzida por um ex-médico nazista. Que de acordo com ele, teria sido descoberta a cura para a loucura.

      Nessa ilha, no tenebroso sul do Atlântico, entre pesquisadores inescrupulosos, pacientes maquiavélicos, macacos astutos e o mais perigoso alucinógeno de todos os tempos (falluspsilocybe), ele, o professor e mais os quatro desventurados companheiros, têm a cada 48 horas a chance de saírem do ciclo horrendo de alucinações a que foram submetidos, para encontrarem um meio de estabilizar a fórmula. E darem um fim à pesquisa da qual eles próprios viraram cobaias.

"Santa Dinfna e os loucos" - L.C.Roman - 2013

       O livro, ao lado do humor e do horror, é um exercício de admiração e perplexidade sobre as geniais e assustadoras teorias que tentam nos explicar. Como Totem e Tabu, de Freud, Melanie Klein, com seus bebês à procura de tesouros dentro do corpo das mães. E até Foucault, personalizado no enredo como o filósofo franco-guianês, numa irônica e completa distorção de sua filosofia. Uma história que antes de ser uma crítica, é uma homenagem a esses e outros pensadores, que ao tentarem nos guiar, nos jogaram, felizmente, em um labirinto de reflexões.

"Santa Dinfna e os loucos" - L.C.Roman - 2013

       O livro, ao lado do humor e do horror, é um exercício de admiração e perplexidade sobre as geniais e assustadoras teorias que tentam nos explicar. Como Totem e Tabu, de Freud, Melanie Klein, com seus bebês à procura de tesouros dentro do corpo das mães. E até Foucault, personalizado no enredo como o filósofo franco-guianês, numa irônica e completa distorção de sua filosofia. Uma história que antes de ser uma crítica, é uma homenagem a esses e outros pensadores, que ao tentarem nos guiar, nos jogaram, felizmente, em um labirinto de reflexões.